Maior júri do País termina com mais 15 condenados por massacre do Carandiru

Fatiado em 4 etapas, julgamento de 111 homicídios na Casa de Detenção em 1992 sentenciou PMs do COE a 48 anos de prisão em regime fechado; eles poderão recorrer em liberdade. Processo acaba com 73 policiais punidos a 20.876 anos de detenção

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Por Luciano Bottini Filho
Atualização:

SÃO PAULO - O julgamento do massacre do Carandiru - o maior júri da história do País - terminou nesta quarta-feira, 2, com mais 15 policiais militares condenados a 48 anos de prisão cada um, em regime fechado. Eles foram considerados culpados por quatro dos 111 homicídios ocorridos na Casa de Detenção, em 2 de outubro de 1992. Com a última sentença proferida, o julgamento, dividido em quatro etapas ao longo de um ano, bateu o recorde de soma de penas individuais já aplicadas: 20.876 anos para 73 PMs. Todos vão recorrer em liberdade.

O juiz Rodrigo Tellini, que presidiu os três últimos júris, reconheceu a dificuldade do caso. "A complexidade deste processo não está somente nos 75 volumes e nos cem números de apensos que ele tem. Não está somente no drama vivenciado pelas famílias das vítimas e pelas famílias dos policiais militares. A complexidade deste processo reside no fato de termos esperado por 22 anos para uma resposta do Estado para essas ações", afirmou.

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O advogado Celso Vendramini contestou a condenação dos policiais do Comando de Operações Especiais (COE), que invadiram o terceiro pavimento do Pavilhão 9, onde 8 detentos foram assassinados - os réus foram absolvidos de 4 mortes e 2 tentativas de homicídio. "Esse julgamento está nulo de pleno direito", afirmou o defensor.

"O juiz fez o absurdo de liberar uma testemunha em uma noite, voltando no dia seguinte para ser ouvida. Mas a testemunha deveria ter ficado incomunicável, ela não pode sair do plenário do júri", alegou o advogado, que vai recorrer.

A testemunha questionada por Vendramini é o perito Osvaldo Negrini, que foi convidado pelo juiz para ser ouvido outra vez durante os debates, caso fosse requisitado. Ele é o único que testemunhou em todos os julgamentos, desde quando o coronel Ubiratan Guimarães foi condenado, em 2001, a 632 anos de prisão, antes de ser absolvido pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP).

No julgamento de Ubiratan, os desembargadores fizeram uma reinterpretação da decisão dos jurados. Com uma mudança na lei processual, é mais difícil que o expediente se repita.

Vendramini, porém, pode tentar anular o júri no TJ-SP, uma vez que segunda instância não pode condenar ou absolver. Uma falha ou nulidade detectada poderia afetar todas as condenações, uma vez que a ação é uma só, e o fatiamento do julgamento dos homicídios é considerado algo inédito.

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O promotor Márcio Friggi disse que espera pelo cumprimento das penas. "Nenhum promotor de Justiça trabalha para uma justiça meramente simbólica", afirmou. "Não tenho como prever quantos anos vão se passar até que as penas sejam efetivamente cumpridas. Lamento muito por um sistema penal arcaico, lento e burocrático. Espero que reformas sejam encaminhadas para diminuir o número de recursos."

O caso. Foram pronunciados 83 PMs - sete morreram ao longo do processo e três foram absolvidos no primeiro júri, em abril do ano passado. Após as condenações dos homicídios dolosos, ainda seriam julgados 86 casos de lesão corporal leve, mas as penas prescreveram.

O processo acumulou mais de 50 mil páginas e passou por uma longa discussão de competência entre a Justiça comum e a Militar. Nos quatro últimos júris, foram tomados os depoimentos de 28 testemunhas de acusação e defesa. Foram usadas cerca de 180 horas de trabalho em plenário, somando o tempo dos jurados reunidos para responder aos quesitos.

Das 111 mortes, 29 foram consideradas de autoria desconhecida, e os jurados absolveram os réus. Outras cinco mortes, que seriam julgadas em um júri separado para o coronel Luiz Nakaharada, não tiveram condenação porque o acusado morreu no ano passado.

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