PUBLICIDADE

Histórias da Garoa

Por Pablo Pereira
Atualização:

BOA MESANa hora do aperto a cozinha resolve

Comer bem é quase uma lei em constante aprimoramento em São Paulo. Há bons cardápios pela cidade e mesmo os apetites mais requintados têm à disposição mesa de qualidade - é só olhar a fartura e as maravilhas que são noticiadas toda semana no prestigiado Paladar, aqui da casa.

Antigamente, os ingredientes não eram tão abundantes, nem disponíveis. Na cidade oitocentista, e mesmo depois da chegada do século 20, quando o crescimento acelerado inflacionou o mercado, o pessoal da cozinha era obrigado a se desdobrar para oferecer boa comida.

Em tempos nos quais os paulistanos almoçavam às 9h e jantavam às 14h, a simples interrupção de uma ponte, travando o acesso de uma das entradas da cidade - como ocorreu com a Ponte Grande da Freguesia de Conceição de Guarulhos, em 1853 -, já elevava o preço da refeição.

O conserto da ponte resolveria "em grande parte a carestia de gêneros de primeira necessidade", registram as Atas da Câmara Municipal de São Paulo, citadas na obra de Ernani Silva Bruno. "O toicinho, por exemplo, passou de 80 ou cem réis a libra para 800 e até mil", conta também o livro Minhas Recordações, de Ferreira Resende, em 1853.

Essa dificuldade no abastecimento já vinha de tempos. Em 1829, lembram as Atas, deveriam as Câmaras de Bragança e Atibaia, cidades abastecedoras da Vila Imperial, colocar em ação seus capitães do mato para impedir a carestia evitando os desvios de carne e outros víveres por "atravessadores".

Mas quem disse que bons cozinheiros se apertam diante da escassez? Ao contrário: essa é a hora da criatividade, do desafio de tornar saboroso o pouco que se tem. E nesse ambiente de baixa oferta se originaram deliciosas receitas paulistanas de ensopados de carne, cozidos, feijão e arroz e as ervas.

Publicidade

Bruno lembra, citando outro memorialista, Veiga Miranda, que uma dessas ervas era a "couve, a saborosa couve". E completa: "para a sobremesa, doces de batata ou de figo ou arroz de leite".

Nada como a competência da cozinha!

COMÉRCIOLeitão, um artigo de exportação

PUBLICIDADE

O toicinho que há séculos faz o prazer de muita gente em São Paulo foi produto muito valorizado na cidade imperial cercada de chácaras. Se nos anos 1600 e 1700 o milho, a caça e o peixe de água doce dominaram o menu paulistano, nos 1800 a criação de suínos foi marcante. São Paulo não só produzia leitão para consumo próprio, à moda da Bairrada portuguesa, como exportava carne salgada e toicinho. Já na virada de 1800 o toicinho era o quarto alimento mais exportado por Santos, perdendo só para açúcar, arroz e aguardente, segundo registros do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.