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Extermínio na periferia criou cracolândia

Com população flutuante de 2 mil pessoas, área de uso de droga em SP se consolidou há 20 anos

Por Bruno Paes Manso
Atualização:

Apesar de haver consumo de crack em todos os Estados brasileiros, nenhum tem concentração de consumidores e perfil semelhantes à cracolândia paulistana. A informação vem de participantes do mapeamento feito pela Fiocruz sobre os locais de consumo de crack no Brasil, cujos dados ainda não foram divulgados.A cracolândia paulistana, que hoje conta com população flutuante estimada em 2 mil pessoas, cresceu e se consolidou a partir de 1992, por causa da coincidência de dois fatores. Em primeiro lugar, o território da antiga rodoviária, onde fica a cracolândia, era a tradicional boca do lixo da cidade. Era lá que ficavam os pontos de uso de droga que historicamente recebiam mais cobertura dos maus policiais civis. Havia, portanto, possibilidade de oferta abundante sem grandes riscos.Ao mesmo tempo, no começo dos anos 1990, as periferias de São Paulo viviam o auge da violência. As chacinas, que chegaram a 98 casos em 1999, vitimavam principalmente usuários de crack. Rodinhas inteiras de consumidores, altamente estigmatizados e chamados de noias, eram dizimadas.O centro da cidade se tornou uma espécie de exílio para aqueles que queriam o crack e fugiam do extermínio nas periferias. Para lá migrou também uma ampla rede de voluntários e ONGs que passaram a tentar ajudar usuários. Essa mistura de solidariedade, consumo alucinado e venda livre criou entre os integrantes da cracolândia uma sociabilidade própria, com costumes e regras locais, além das cenas tristes que se repetem. Talvez as mais dramáticas sejam as de pais em busca de filhos que não querem mais voltar para casa.Desafio. Diante da realidade, o psiquiatra Auro Lescher, do Projeto Quixote, um dos especialistas há mais tempo trabalhando no local, luta para que crianças e adolescentes da cracolândia sejam tratados como "refugiados urbanos". "O crack não é só desafio de saúde pública ou polícia. É problema humanitário."

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