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Em um ano de crise, estoque de água nos reservatórios cai 74%

Mananciais que atendem a região metropolitana de SP somavam 1 trilhão de litros em 27 de janeiro de 2014; hoje, restam 267,8 bilhões

Por Fabio Leite e Rafael Italiani
Atualização:

SÃO PAULO - Um ano após o início da pior crise hídrica paulista, o estoque de água disponível para abastecer 20 milhões de pessoas na Grande São Paulo caiu 74%. Quando a Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp) emitiu o primeiro alerta sobre a seca no Cantareira, em 27 de janeiro de 2014, os seis mananciais que atendem a região mais rica do País somavam 1 trilhão de litros armazenados. Hoje, restam 267,8 bilhões, 12,4% da capacidade dos reservatórios.

A crise começa a ganhar ares trágicos na medida que as reservas de água continuam caindo na temporada de chuvas, fenômeno que se repete pelo segundo verão consecutivo. Esta é a pior seca nos últimos 85 anos. Mantendo esse ritmo, essa reserva pode acabar em 206 dias.

Bombas fazem captação do volume morto Foto: Marcio Fernandes/Estadão

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Há um ano, o Cantareira estava com 23,1% de capacidade – hoje, com o uso do volume morto, o nível está 23,7% abaixo de zero – e o estoque para toda a região metropolitana era de 47,3%, volume que foi suficiente para atravessar o período seco de 2014, já com economia e cortes na distribuição de água.

De lá para cá, a Sabesp lançou um programa de bônus para quem economizar água, bombardeou nuvens para provocar chuva artificial, retirou bairros da capital da área de cobertura do Cantareira e reduziu a pressão na rede para diminuir as perdas por vazamentos. O rodízio oficial chegou a ser planejado em janeiro, conforme o Estado revelou em agosto, e o racionamento admitido e negado várias vezes pela gestão Geraldo Alckmin (PSDB).

“As chuvas são bem inferiores à expectativa para o verão e a situação atual das represas é muito pior do que em 2014. O cenário é de esgotamento”, afirma Marussia Whately, coordenadora do Instituto Socioambiental (ISA). “O fato é que as medidas adotadas até agora não foram suficientes para reservar o máximo de recursos para 2015. Além do impacto social, isso vai repercutir economicamente na região que concentra um quarto do PIB do Brasil”, diz Samuel Barrêto, especialista em recursos hídricos da ONG The Nature Conservancy (TNC). 

Com todas as ações, a Sabesp conseguiu reduzir em 23% o volume de água produzido na Grande São Paulo, de 69 mil litros por segundo em média antes da crise para os atuais 53 mil litros. Economia ainda pequena diante do déficit diário de água nos mananciais, em especial o Cantareira, que caminha para captar água de uma terceira cota do volume morto. Em um ano, as perdas nos sistemas chegam a 753 bilhões de litros, volume quatro vezes superior à capacidade da Represa do Guarapiranga, na zona sul.

No início deste ano, o discurso oficial sobre a crise mudou com os novos gestores na Secretaria de Saneamento e Recursos Hídricos e na direção da Sabesp. O governo lançou a sobretaxa para quem aumentar o consumo, medida que havia sido descartada em julho, e voltou a admitir risco de racionamento.

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O novo tom teve reflexo direto na população, que tem sofrido ainda mais com cortes no abastecimento e passou a acreditar que a água pode mesmo acabar. “Do jeito que está, nesse calor insuportável, a pouca chuva que vem evapora. Tenho muito medo”, diz a professora Marilu Romano, de 60 anos, de Pinheiros, zona oeste.

Já a diarista Mariléia Feitosa da Silva, de 21 anos, pensa em voltar para o Maranhão. “Lá tem água. Eu vim para São Paulo há uns quatro meses, já sabia que estava sem água aqui. Até agora está dando para sobreviver. Se não der, eu volto”, diz a moradora de Paraisópolis, onde tem água dia sim, dia não. 

Comércio e indústria. A preocupação dos setores da economia paulista, que já era grande no ano passado, se agravou. A Federação das Indústria do Estado de São Paulo (Fiesp) está mapeando o subsolo da Grande São Paulo em busca de água. “Vamos incentivar as empresas a formar consórcios para captar e distribuir a água”, afirmou Nelson Pereira dos Reis, diretor da entidade. 

Segundo ele, tanto as pequenas quanto as grandes indústrias devem mudar seus turnos de trabalho para conseguir aproveitar as horas em que há abastecimento público. O mesmo deve acontecer no comércio. “As perspectivas, por qualquer lado que a gente olhe, são muito preocupantes. O governo deveria ter alertado de maneira bastante forte a população”, disse Antonio Carlos Pela, do Conselho de Política Urbana da Associação Comercial.

Governo. O pedido do Estado para entrevistar o secretário de Recursos Hídricos e o presidente da Sabesp sobre um ano de crise não foi atendido.

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