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Alunos relatam novos abusos; trotes tinham até ingestão de fezes

Nova audiência na Assembleia Legislativa de SP registra casos de violência na PUC de Sorocaba e na Escola de Agricultura da USP

Por Luiz Fernando Toledo
Atualização:

Atualizada às 20h26

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SÃO PAULO - Nesta quarta-feira, 14, a audiência da CPI que apura violações de direitos humanos em universidades de São Paulo registrou novas denúncias, agora relacionadas aos trotes do curso de Medicina da Pontifícia Universidade Católica de Sorocaba (PUC) e da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz da Universidade de São Paulo (Esalq). Além dos novos relatos, feitos por estudantes das instituições, outros dois alunos depuseram sobre casos já revelados pelo Estado em unidades da Universidade de São Paulo. 

O aluno de medicina da PUC Sorocaba, Rodolfo Furlan, de 22 anos, disse que a realidade dos trotes envolvia ingestão de vômitos e fezes pelos calouros. "A realidade que eu via era muito cruel", disse. 

Segundo o jovem, que entrou na instituição em 2011, o trote tem duração de três meses. Os "bichos" eram obrigados a comprar kits com um uniforme que deveria ser usado por todos, pelo valor de R$ 250. Homens e mulheres, segundo ele, eram obrigados a vestir sempre a mesmacamiseta larga, sapato fechado e calça jeans. "Mulher não podia usar brinco, maquiagem. Se usasse maquiagem os veteranos forçavam a tirar no banheiro", contou.

Depoimento de estudante na Comissão Parlamentar de Inquérito sobre violações dos direitos humanos em universidades Foto: JF DIORIO / ESTADÃO CONTEÚDO

Para resistir à violência, Furlan criou, com a ajuda de outros alunos, um grupo de apoio aos calouros. Em 2013, este grupo elaborou um relatório de 100 páginas com relatos diversos ocorridos em festas organizadas pelos alunos. Dentre os episódios, alunos que eram obrigados a ajoelhar e beber até desmaiar, veteranos que rasgavam as roupas dos calouros, uso de alho e cebola nos cabelos dos alunos, ingestão de fezes, vômito e urina.

De acordo com o aluno, o documento foi protocolado na reitoria no mesmo ano, mas não houve retorno. As festas eram organizadas pela Associação Atlética Acadêmica Vital Brasil, que, segundo Furlan, têm como principal fonte de renda a venda dos kits aos calouros.

Além da PUC Sorocaba, uma estudante que pediu para não ser identificada relatou abusos nos trotes da Esalq. Ela apontou que era prática comum que os veteranos colocassem drogas nas bebidas durante as festas, sendo ela uma das vítimas. 

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A aluna também denunciou uma prática obrigatória para ingresso em repúblicas controladas pelos estudantes. Ela disse que abordou um jovem na universidade que estava com roupas rasgadas e perguntou o que tinha ocorrido. Ele teria dito que passou pelo processo de "aceitação", em que levava chibatadas nas costas, e que estava orgulhoso por ter sido aprovado na casa. Segundo a aluna, "é o que separava os homens dos meninos", Outra prática recorrente, segundo a jovem, era obrigar os "bichos" a ingerir comida estragada.

O aluno do quinto ano de medicina da FMUSP, Yuri Régis, de 23 anos, comentou sobre os ritos de passagem no Show Medicina. Ele disse que os alunos eram chamados em um anfiteatro dentro da universidade, eram obrigados a beber e depois eram humilhados com xingamentos racistas, homofóbicos e até mesmo contra judeus. Os casos de medicina foram os primeiros a vir a público, após denúncia de duas alunas em audiência na Alesp em novembro do ano passado. Os relatos motivaram a criação da CPI.

Casos anteriores. Outros casos abordados foram os do estudante Felipe Yarid, do último ano de agronomia na Esalq, que alegou ter sido envenenado "várias vezes" por veteranos ao se recusar a participar dos trotes. Ele relatou que recebeu disparos de um veneno chamado inibidor de colinestarase, com uso de pipetas. O produto, utilizado para matar insetos, pode causar cansaço e paralisias temporárias. De acordo com o jovem, como ele não conseguiu provar o envenenamento, não houve denúncia formal. O caso foi revelado pelo Estado em 2011.

Outro episódio relatado foi o da estudante de veterinária da USP Bianca Cestaro, que afirmou ter sido estuprada por um estudante intercambista em uma festa em Pirassununga. A Faculdade de Zootecnia e Engenharia de Alimentos (Fzea) deve abrir sindicância no início do ano letivo, conforme antecipou o Estado no final de 2014.

E-mail. Além dos relatos, o Estado apurou que o e-mail criado pela CPI e por coletivos feministas já recebeu oito novas denúncias,incluindo estupros. Os episódios teriam ocorrido na Fmusp - dois estupros - e na Esalq, com relatos de trotes abusivos. Os casos teriam ocorrido entre 2004 e 2014. Osdenunciantes se recusaram a depor na CPI e não fizeram denúncias formais.

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