Estudante da USP vira réu por estupro e foge para o exterior

Justiça mandou reter passaporte uma semana após viagem; defesa alegou provas circunstanciais e ‘comportamento atípico’ da vítima

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Por Luiz Fernando Toledo
Atualização:
Investigação. Caso foi revelado por aluna na CPI do Trote na Assembleia Legislativa de SP Foto: JOSÉ PATRÍCIO/ESTADÃO

SÃO PAULO - Mais um aluno da Universidade de São Paulo (USP) acusado de estupro virou réu na Justiça. O juiz Donek Hilsenrath Garcia, da 1.ª Vara Criminal de Pirassununga, aceitou denúncia contra o estudante de Medicina Veterinária intercambista Aylton Lino Rangeiro Leão, de 22 anos, que veio de Moçambique para estudar na Faculdade de Zootecnia e Engenharia de Alimentos (FZEA-USP). O Estado teve acesso aos autos do processo, sob sigilo. O jovem deixou o País em dezembro. 

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Leão é acusado de ter abusado sexualmente de uma estudante da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia (FMVZ), que estava alcoolizada, na festa universitária Volta da Pinga, no interior da República Bohemia, na FZEA, em julho de 2013. O caso foi revelado pela aluna na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Trote, na Assembleia Legislativa. 

Este é o segundo caso de estupro aceito pela Justiça desde a CPI - em janeiro, o Estado revelou que um estudante da Faculdade de Medicina da USP também virou réu. O episódio já foi investigado em sindicância interna, que concluiu em maio do ano passado que houve estupro e indicou como punição a expulsão. O documento foi repassado à Comissão de Direitos Humanos, mas até agora não houve decisão. Procurada, a universidade disse que o processo está em andamento, mas não se manifesta em casos sob sigilo. 

Segundo a denúncia do Ministério Público, a jovem dirigiu-se a um dos quartos do imóvel, onde foi abordada pelo acusado, que tentou beijá-la e tocá-la. Ela teria resistido às investidas, mas dormiu no local. Algum tempo depois, acordaria com as calças abaixadas e com o rapaz a penetrando. Um funcionário confirmou a história ao MP, que chegou a pedir a retenção do passaporte do estudante, mas a decisão do juiz proibindo o acusado de se ausentar do País só viria no dia 24 de dezembro, uma semana depois da viagem. A denúncia havia sido feita em 2 de dezembro.

À Justiça, o advogado de Leão, Julio Cesar Reis Marques, diz que a denúncia está fundamentada “unicamente” por elementos circunstanciais e que a vítima “adota comportamento atípico, evidenciado pelo seu ativismo feminista e necessidade de exposição”. A estudante violentada diz que sofreu ameaças.

DEPOIMENTO - ‘Recebi ameaça pela internet’

A minha faculdade foi ágil na apuração. O resultado e a postura da comissão foram até surpreendentes para quem vive em um mundo machista em que sempre se culpa a vítima. Mas, depois que o processo foi para reitoria, não me falaram nada.  Hoje eu tenho de tomar muito cuidado com as minhas faltas desde o ocorrido, porque além de ter faltado por depressão, recentemente tive de faltar para ir ao escritório de advocacia que está ajudando no meu caso. 

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Também tenho recebido ameaças pela internet por ter denunciado meu estupro. São adolescentes e velhos que dizem que eu mereci ser estuprada e deveria ficar quieta. Às vezes isso me assusta um pouco e eu fico um tempo sem conseguir me concentrar. Fico imaginando tudo que eu deixei de aproveitar na faculdade, por causa do estupro, tanto social quanto academicamente. Mas hoje consigo ter orgulho de ter denunciado e ser um pequeno exemplo para outras meninas.” 

(Estudante de 29 anos que denunciou o estupro)