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Se a hierarquia militar é tão importante, por que os PMs desobedecem ostensivamente o Comandante Geral? Reflexões sobre o vídeo da polícia

Por Bruno Paes Manso
Atualização:
 Foto: Estadão
 Foto: Estadão

 

Creio que os bons policiais militares (talvez a maioria) ficaram envergonhados e agora vão encher o blog com duras críticas contra os colegas responsáveis pela gravação e divulgação da cena de três jovens agonizando dentro de um carro depois de uma perseguição policial. Também imagino que esses PMs irão nos comentários elogiar a imprensa por alertar o Comando Geral da PM e a Secretaria de Segurança do ocorrido, ajudando assim a corporação a identificar e a punir os desviantes.

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Na tarde de ontem, coube aos repórteres independentes André Caramante e Laura Capriglione noticiarem via redes sociais o vídeo em que admiradores da truculência da PM haviam postado numa página do facebook chamada Polícia do Estado de São Paulo. Como informou Caramante, os responsáveis pela publicação do vídeo afirmam que o caso aconteceu dia 8 de abril, na Vila Curuçá, na zona leste de São Paulo. Dos três baleados pelos PMs, dois estavam hospitalizados e um morreu. O vídeo, postado na terça-feira, dia 14, foi removido depois do começo da repercussão.

É especialmente triste o momento em que um dos baleados diz "meus filhos" e uma voz ao fundo responde "vai demorar aí, cara...?. É pra morrer".

Nessa página não oficial da Polícia, com mais de 20 mil curtidas, o vídeo foi compartilhado mais de 700 vezes, com uma série de comentários desumanos, para não dizer doentios, dando risada das cenas (há, há, há/ rsrsrs), chamando os mortos de bandidos e festejando a atitude dos PMs. Na parte inferior da tela, aparece a bota e a calça do cinegrafista com a cor do uniforme da polícia. A imagem do fiat preto também mostra, aparentemente, o reflexo da filmagem sendo feita por um policial. A corregedoria da PM afirma que vai investigar a autoria das imagens.

Não é a primeira vez, nem será a última, que integrantes da corporação vão se envolver em deprimentes cenas de barbárie. Em novembro de 2012, às vésperas de assumir o comando geral da PM, o coronel Benedito Meira gentilmente me recebeu no Palácio dos Bandeirantes. Era a primeira entrevista que ele dava depois de indicado ao cargo, no auge da crise de segurança daquele ano. Parte da conversa foi sobre os Admiradores da Rota, página da internet que espalhava imagens de caveira e defendia a morte de bandidos, ao mesmo tempo em que detalhava as ocorrências policiais da tropa, indicando que eram alguns de seus integrantes os responsáveis pela apologia ao crime.

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Na conversa, Meira disse que não mais admitiria nas páginas do facebook policiais incitando a violência e associando a caveira à imagem da PM. Na minha frente, eu via a fala de um coronel que estava sendo sincero e que acreditava naquilo que falava. Mas restava combinar com a tropa. Meira dava ordem ao vento. Hoje ele falou duramente sobre o caso e disse que afastou os policiais que estavam na ocorrência do dia 8.

Situação parecida de desmando ocorreu no começo do ano, tema do post de estreia deste blog. Depois da morte de um policial em Sapopemba, em dezembro, PMs passaram a ameaçar a população do bairro para descobrir o nome do autor do atentado. Com medo, a população pediu ajuda da Secretaria da Segurança e do Comando Geral, realizando duas audiências públicas. As autoridades se compromissaram em dar segurança a eles. Mesmo assim, poucos dias depois, carros descaracterizados mataram três pessoas. Apesar do desafio feito pelos assassinos ao Governo de São Paulo, ontem, como informou a repórter Lúcia Rodrigues, nenhum oficial da PM compareceu à Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa para debater o caso.

Aproveito para levantar a pergunta: se as ordens do comandante geral são recorrentemente desobedecidas, a gestão militar da polícia é de fato a mais apropriada para manter a disciplina e ordem da corporação? Últimas perguntas, sobre a foto acima, com policiais militares perfilados em frente a barracos de alvenaria, que está na capa da página não oficial da polícia do Estado de São Paulo. Eu estou exagerando ou foto revela o preconceito de alguns integrantes da corporação contra moradores pobres da periferia? Eu estou forçando a barra ou a imagem parece simbolizar que os policiais estão armados para nos proteger dos moradores de casas daquele tipo?

Boas perguntas para serem debatidas. Ontem, recebi um convite da Diretoria de Polícia Comunitária e Direitos Humanos da PM para participar de uma reunião onde seria pedido financiamento para a realização de estudos sobre a corporação. Infelizmente eu não pude ir. Mas volto a me colocar a disposição (mais para ouvir do que falar) em um eventual debate democrático sobre reformas nas polícias e desmilitarização.

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