Foto do(a) blog

Espaços públicos, caminhadas e urbanidade.

Calçadas. A lei existe e ninguém cumpre. A prefeitura multa mas não cobra. Enquanto isso, caímos nos buracos.

PUBLICIDADE

Por Mauro Calliari
Atualização:

A "calçada-garagem" Foto: Estadão

 

As repórteres do Estadão Gabriela Caesar e Luciana Amaraldescobriram um fato interessante e alarmante: só 1,4 % das multas que a Prefeitura de São Paulo cobra dos donos de casas cujas calçadas estão em situação ruim são pagas.

PUBLICIDADE

Essa informação, na verdade, conta várias histórias ao mesmo tempo. Vamos por partes:

Sim. As calçadas têm problemas

Todo mundo que anda na rua conhece os problema e reconhece essas calçadas. Algumas avenidas até que ficam razoáveis, com a padronização de material e calçadas rebaixadas, mas a manutenção não é boa. Nas ruas menores, residenciais, que dependem dos moradores, a situação das calçadas é péssima, cada um fazendo o que quer na frente de suas casas:

 

Publicidade

A "calçada-cilada" Foto: Estadão

 

A legislação. Hoje, a responsabilidade pelas calçadas paulistanas é dos donos dos imóveis

As ruas normalmente têm um pedaço para os carros, outro para ônibus, outro para bicicletas, outro para canteiros e um último para pedestres - a calçada. Nas grandes cidades brasileiras, todos são cuidados e pagos pela prefeitura. Menos as calçadas. Quem cuida da calçada é o dono do imóvel. A exceção são aqueles eixos de alta circulação, próximos de estações ou nos calçadões. Existem projetos de entidades, vereadores e até deputados federais para mudar isso. Mas é coisa que pode demorar anos, e mesmo que seja aprovada a lei, vai faltar dinheiro. Enquanto isso, a gente vai continuar torcendo o pé nos buracos e tropeçando nos degraus. Então, vamos ter que tomar conta do pedaço que está em frente da nossa casa.

A "calçada-escada" 

A prefeitura não parece estar dando muita prioridade para as calçadas. Nem para multar os privados nem para melhorar as calçadas que são de sua responsabilidade

Se foram emitidas menos de 4 mil notificações em um ano, é claro que a fiscalização não está sendo muito forte. Se não, talvez fossem 40 mil ou 400 mil. Em cada caminhada, cada um de nós é capaz de encontrar dezenas de situações de risco. Se todas fossem multadas, provavelmente surgiriam protestos veementes. Alguém levantaria a questão da assimetria: as calçadas esburacadas em frente aos órgãos públicos seriam multadas também? E as pedras portuguesas dos calçadões do centro que não são repostas? A Prefeitura estaria pagando uma multa para si mesma? E uma calçada em frente a um órgão estadual, ou uma escola. Também deveria pagar, não? Provavelmente, essas questões iriam parar no Judiciário, como várias outras quando não são resolvidas. Enquanto isso, desviamos dos buracos.

A "calçada-caatinga" 

A "calçada-cratera" 

Os donos dos imóveis não parecem em muito preocupados em melhorar aquilo que eles têm na frente de suas casas, lojas e prédios.

Publicidade

CONTiNUA APÓS PUBLICIDADE

Quem nunca sai de casa a pé, não vai pensar em cuidar da sua calçada. Mas quantas vezes essa pessoa já recebeu um aviso, uma comunicação, um papelzinho, um nota ou qualquer coisa sobre isso?

É fácil saber se uma calçada está boa ou não. Existem testes que o pessoal aplica às calçadas e várias metodologias internacionalmente reconhecidas. Elas têm o mérito de padronizar as avaliações. Mas, vamos falar a verdade, é muito fácil ver quando alguma calçada tem problemas: dê uma volta com um carrinho de bebê, ou um carrinho de feira. Na hora que a roda travar, você vai saber que ali precisa ser arrumado. Pense agora que não é mais um carrinho, é uma cadeira de rodas, pesada, larga. Os cadeirantes que não conseguem dar uma volta no quarteirão para ir até a padaria, a banca ou o ponto de ônibus não saem de casa e não entram nas estatísticas. Não é muito melhor gastar um dinheirinho ou um cimento para deixar a calçada lisinha, sem degraus?

 

A "calçada-ficção"

Tem solução? Claro! Um pouquinho melhor a cada dia.

Como todos os problemas complexos, não há solução fácil. Mas não precisa ser tão difícil assim. A cidade precisa ir melhorando um pouco a cada dia. Hoje, seria bom que menos calçadas estivessem ruins do que ontem. E assim por diante.

Publicidade

Uma ação prática seria a prefeitura  concentrar suas ações nos grandes eixos, melhorar a acessibilidade nos pontos de ônibus, nos acessos, nos territórios das operações urbanas e nos lugares onde tem muita gente e ir ampliando aos poucos, planejadamente e com boa manutenção.

 Foto: Estadão

A calçada "Que se vire o pedestre"

No resto das ruas, que ainda serão cuidadas pelos proprietários, seria bom que a prefeitura arranjasse um jeito inteligente de mostrar ao morador o que tem de errado e alertá-lo. E se o dono do imóvel não fizer nada, uma equipe poderia ir lá, resolver o problema da calçada com material e processos padronizados e depois mandar a conta e cobrar (junto com o IPTU ou algo assim). É melhor isso do que emitir algumas poucas multas erráticas e depois não cobrá-las.

Melhor que tudo isso, é você olhar para a calçada em frente à sua casa e fazer o teste. Se não der para andar com um carrinho de bebê, um carrinho de feira ou uma cadeira de rodas, invista numa reforma básica. O retorno é garantido.

 

Publicidade

Fotos: M.Calliari

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.